terça-feira, abril 28, 2009

00:47
eu estou sentada num bar escuro e enevoado pela fumaça dos cigarros e charutos acesos ao meu redor. Minha mesa é a de um canto bem perto do palco improvisado, e eu estou sentada só. Com a mão direita apoiando o queixo e a mão esquerda segurando mais um dos cigarros inebriantes, nem tenho consciência de que existo. A única coisa que se mostra em movimento é a banda. Charles Mingus de olhos fechados, dedilhando seu contra-baixo antiquíssimo, macio, ondulante, alcalino. Meus amigos conversam um pouco entre si, todos músicos, comentando os intervalos e escalas, ou a ausência deles. De vez enquando, desvio um pouco a minha atenção para a conversa, rindo de alguma piada ou comentando alguma observação feita.

Na mesa atrás da minha, está um grupo de homes de meia-idade jogando pôquer. Um barbudo gordo com um chapéu-côco preto e cabelos batendo nos ombros, um magrelo alto com a face encovada, um nem gordo nem magro, a barba perfeitamente feita, suspensórios vermelhos, blusa branca de botão e mangas compridas, olhar sevagem e boca encrispada. Esse último, tira o charuto da boca, cospe e o põe de volta, mordendo a ponta e olhando mais uma vez suas cartas. Ele aumenta a aposta.

Na mesa do meu lado (esquerdo, já que eu estou encostada na parede do lado direito), está sentado um negro com a cabeça raspada, o seu chapéu em cima da mesa, um tatuagem de um símbolo, possivelmente celta, que eu não sei o que significa. Ele usa blusa de botão sem manga e calças plissadas cinza. Uma moça vstida de preto, com longos cabelos encaracolados e pele muito branca chega e senta ao seu lado.

Na mesa à frente do recém-composto casal, está aquele que desviou minha atenção por um período mais longo, e que vou chamar de Y: cabelos compridos escuros, olhos profundos e vidrados na banda, sobrancelhas expressivas e pés marcando o tempo da música. Ele fuma um cigarro atrás do outro, marca o tempo da música com os pés, ensaia uns dedilhados com a mão livre, e sua expressão denuncia anos e anos a mais do que seu corpo aparenta. Em sua mesa estão sentados outras pessoas. Elas bebem e conversam, riem e se movimentam. A única pessoa que parece estar alheia à tudo é Y, que mal pisca os olhos.

Ele parece a síntese do som, grave e introspectivo, sensível e bruto. Ele levanta e vai ao banheiro, e seus movimentos parecem ditados pela harmonia e pelo ritmo. Ele se chama, finalmente descubro, Summertime...

E ele é composto de contra-baixo, piano e bateria.
e eu o amei
:)

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